Quem são os nómadas digitais em Portugal?
Têm empregos que não os prendem a um local fixo, horários de trabalho muitas vezes flexíveis, podem escolher onde querem viver e valorizam o equilíbrio entre o trabalho e o lazer. São os nómadas digitais, que escolhem países como Portugal pela segurança, beleza do país, condições climatéricas, menor custo de vida ou qualidade de infraestruturas como as da saúde. Estes trabalhadores em permanente movimento estão a ser encarados pelos governos como um novo instrumento de dinamização económica, apesar de não existir propriamente um consenso em torno deste tipo de política.
A pandemia, já sabemos, veio trazer a necessidade de trabalho remoto e o resultado acabou por ser uma mudança de mentalidades e de formas de trabalhar. Muitos líderes empresariais perceberam que não é por estarem à distância que os seus colaboradores trabalham menos – muito pelo contrário – e que esta é até uma solução que, para além de agradar aos trabalhadores, traz potenciais poupanças nos custos operacionais das organizações.
Assim, o fim da pandemia não levou a um retrocesso completo para velhos hábitos. Pelo contrário. Muitas empresas passaram a ter um regime dito ‘misto’ em que os trabalhadores estão parte do tempo no escritório e outra parcela em casa ou em qualquer outro sítio onde disponham de internet e estejam contactáveis. Consoante a área de atividade e a política de gestão, outras organizações passaram a operar apenas online ou, pelo contrário, regressaram ao formato totalmente presencial.
A juntar ao efeito da pandemia e seus confinamentos, vários países criaram regimes jurídicos destinados a atrair este tipo de trabalhadores e Portugal é um deles. Em outubro de 2022 foi lançado um visto de estada temporária para nómadas digitais, destinado a cidadãos de fora da União Europeia ou do Espaço Económico Europeu, para que possam trabalhar a partir de Portugal para outros países, com condições atrativas.
A Portugal têm chegado pessoas vindas de vários países de origem, como é o caso do Reino Unido, França, Brasil ou EUA. E mesmo portugueses que emigraram há vários anos, mas que trabalham em empresas que permitem o trabalho remoto, e que regressam agora ao país de origem, com custos mais baixos e os salários dos mercados de onde vêm. Em comum têm o facto de serem pessoas com uma forma própria de estar na vida em que não abdicam de ter o melhor dos dois mundos: trabalhar naquilo de que gostam e viver onde querem.
Como e no que trabalham os nómadas digitais
Uma vez que não têm a obrigatoriedade de se deslocarem todos os dias para o escritório, os nómadas digitais podem escolher diferentes soluções para trabalhar. Basta que sejam espaços com uma boa ligação à Internet, um custo aceitável e, se possível, bastante conforto.
Alguns optam por trabalhar em cowork com outros nómadas digitais e fazem desse intercâmbio parte integrante da sua experiência. Existem cada vez mais espaço de coworking que proporcionam, em simultâneo, o acesso a vários serviços e apoios e ainda o intercâmbio e partilha de experiências com outras pessoas na mesma situação.
Não raras vezes, estas soluções de cowork estão associadas a propostas de coliving. Nestes casos, falamos de espaços de arrendamento de curto prazo que oferecem quartos privados e espaços de trabalho e lazer comuns. Algumas unidades de alojamento contam mesmo com programas específicos para este perfil de trabalhador.
Até algumas cadeias hoteleiras oferecem cada vez mais este serviço. E não é por acaso. Esta é uma oportunidade de rentabilizar mais as unidades e de compensar, por exemplo, as menores taxas de ocupação das épocas baixas.
Em termos de perfil, estes são indivíduos que, por regra, têm entre 30 e 40 anos, trabalham em áreas como a publicidade e o marketing, as tecnologias de informação, a programação, a escrita, as redes sociais ou qualquer outra área que permita estar à distância. São freelancers, profissionais de empresas com modelos de trabalho flexíveis ou empreendedores.
O visto para nómadas digitais
Lançado no último trimestre do ano passado, o novo visto foi desenhado para atrair pessoas que querem trabalhar em regime remoto e permanecer em Portugal por um período superior ao de um turista normal, mas sem as ‘amarras’ de um residente.
Devem ter rendimentos médios, nos últimos três meses, superiores a quatro ordenados mínimos portugueses, o que, desde 1 de janeiro de 2023, se traduz em cerca de 3040 euros brutos mensais. Em causa estão, em média, estadas de até 180 dias. A estes trabalhadores são oferecidas vantagens fiscais, nomeadamente na tributação em sede de IRS.
Este visto para nómadas digitais tem sido alvo de muitas críticas. Contesta-se nomeadamente o facto de, ao contrário das empresas, estes trabalhadores terem condições mais favoráveis sem contrapartidas – como encargos com escritórios e pessoal – que compensem o país que os recebe pelos benefícios proporcionados. E criticam-se os danos colaterais da promoção de uma maior gentrificação e subida do custo de vida. Para os governos dos países que estão apostados em atrair estas pessoas, o IRS que não é arrecadado é compensado, desejavelmente, pelos estímulos às economias locais, nomeadamente via consumo, tributação indireta e maior dinamismo demográfico.
Ainda que não seja consensual, o crescimento dos nómadas digitais constitui também uma oportunidade para conhecer os trabalhadores do futuro, ou seja, esta nova geração de pessoas que têm uma forma distinta e nova de trabalhar. Os empregadores terão, cada vez mais, de lidar com colaboradores mais informados e conscientes dos seus direitos e para os quais é fundamental ter um equilíbrio entre o trabalho e o lazer. Está em marcha todo um novo paradigma laboral.