É o fim do home office?
Mais de três anos após o surgimento da pandemia de Covid-19, que introduziu o home office em tantas empresas e casas, ainda não é possível saber, de forma inequívoca, qual será o modelo que vai vingar no mundo laboral.
O home office tem vindo a diminuir, com muitas organizações a reclamar o regresso dos colaboradores ao modo presencial. Empresas como a Disney, a Goldman Sachs, a Google, a Meta ou mesmo a Zoom (sim, essa mesmo) estão a exigir o regresso dos funcionários ao escritório.
No entanto, é também considerável o número de empresas que têm vindo a adotar um modelo híbrido, em que o trabalho presencial e à distância coabitam com relativa tranquilidade, deixando margem para que os colaboradores possam gerir melhor o seu tempo. Outras organizações estão a desenvolver modelos de negócio totalmente assentes no trabalho remoto, sendo os seus colaboradores muitos dos que hoje apelidamos de nómadas digitais.
Fatores como o setor de atividade em causa, a dimensão do negócio, o perfil da gestão ou até o meio cultural em que a organização está inserida, vão condicionar o formato que cada empresa irá adotar.
A discussão está para durar, com argumentos válidos e diversificados de ambos os lados a alimentar o debate.
Os argumentos contra o home office
Depois de a pandemia ter obrigado empresas e trabalhadores a adaptarem-se ao trabalho à distância, foi com grande expectativa que se começou a especular sobre se este passaria ou não a ser o novo normal.
O fim dos confinamentos fez regressar muita gente ao escritório. E têm sido notícia vários casos de grandes multinacionais a assumirem que querem os seus funcionários de volta ao local de trabalho. Com que argumentos?
Várias organizações consideram que, para que a cultura corporativa seja nutrida, os colaboradores devem estar fisicamente na empresa. Muitos gestores garantem, ainda, que os níveis de produtividade, faturação e retenção de pessoal melhoraram com o regresso dos funcionários às empresas, embora haja quem defenda exatamente o oposto.
Por outro lado, a pandemia desmontou, de facto, muita da enorme desconfiança que existia sobre o trabalho remoto. Mas as mentalidades demoram em mudar, sobretudo quando em causa estão valores e formas de pensar tão impregnadas na cultura. Até porque em causa estão novos modelos de funcionamento que representam uma disrupção – em maior ou menor grau – com uma forma de trabalhar que existe desde sempre.
Há, no entanto, outro argumento que tem sido usado por muitas empresas, para o regresso ao modelo presencial, relacionado com a proteção de dados. Para setores como o financeiro ou o tecnológico, o trabalho remoto aumenta a possibilidade de quebras de segurança e fugas de informação.
Já do ponto de vista dos trabalhadores, e se é verdade que muitas pessoas já não se imaginam a estar, de segunda a sexta, sempre no escritório, o Homem é, por natureza, um ser social, o que também pesará no momento de se encontrar a melhor solução.
Os prós do home office
Antes da pandemia, era ponto assente para as lideranças, que, sem a supervisão direta e presencial das chefias, os colaboradores iriam trabalhar menos e pior. A realidade pandémica mostrou que tais ideias pré-concebidas não tinham, em boa medida, razão de ser.
Em paralelo com esta constatação, muitas empresas viram no trabalho remoto a possibilidade de conseguir importantes poupanças de custos. Ter todos os colaboradores ‘on site’ implica um conjunto de despesas relacionadas com o gasto de energia, água e utilização de diversos equipamentos. Muitos gestores puderam observar, que, durante a pandemia, não só estes custos diminuíram, como, ainda por cima, muitos colaboradores passaram até a trabalhar mais horas do que anteriormente. Isto por não perderem tempo em deslocações e não terem de conjugar o trabalho com os muitos constrangimentos normalmente inerentes ao dia a dia, sobretudo os associados à vida familiar.
Por outro lado, os próprios trabalhadores descobriram uma outra forma de trabalhar e perceberam as inúmeras vantagens de serem mais ‘donos’ do seu tempo. Não só em termos práticos e logísticos, mas também pelos efeitos benéficos na gestão de stress e prevenção de episódios de burn-out. Ainda que, claro, o trabalho à distância não esteja totalmente a salvo deste tipo de desgaste laboral.
Em resultado, muitas empresas têm agora de gerir trabalhadores mais exigentes quanto às suas necessidades e mais conscientes da importância de um melhor equilíbrio entre trabalho e lazer. Não é, de resto, por acaso que a discussão em torno da semana de quatro dias ganhou força com a pandemia.
Novas culturas empresariais
Esta mudança de paradigma trazida pela pandemia faz com que os indivíduos se sintam hoje muito mais legitimados na sua demanda por um maior equilíbrio entre trabalho e vida pessoal junto dos seus empregadores. A consequência é uma nova pressão sobre as empresas.
Não basta esgrimir argumentos sobre a produtividade, criatividade e espírito de equipa que o trabalho presencial pode trazer. É fundamental que os trabalhadores constatem, eles próprios, as vantagens de trocar a comodidade do home office pelo escritório. Locais de trabalho que promovam uma maior proximidade entre chefias e restantes colaboradores, que fomentem o debate e a troca de ideias e que estimulem o trabalho em equipa serão, cada vez mais, o caminho para as empresas.
Depois, o tal novo paradigma trouxe também uma nova variável para o recrutamento e retenção de pessoal: a flexibilidade. Oferecer a possibilidade de um emprego com um modelo híbrido e flexível de gestão entre trabalho presencial e remoto é uma vantagem competitiva para as empresas.
Se, por um lado, se assiste a uma tentativa de várias empresas de regressar ao ‘velho’ modelo do trabalho presencial, muitos especialistas em matérias laborais acreditam que o modelo que vai prevalecer no futuro será misto. O formato em que os trabalhadores dividem a semana, entre dois ou três dias no escritório e os restantes em casa, será, para estes analistas, o mais comum.
Quando falamos neste tema, talvez não seja exagerado dizer-se, como no ditado popular, que “ainda a procissão ainda vai no adro”. Empresas e trabalhadores estão a adaptar-se a um novo paradigma, em que, pela primeira vez na História, o trabalho ‘on-site’ deixou de ser, obrigatoriamente, a regra.
Seja qual for a evolução nos próximos tempos, é já certo e sabido que o ‘one size fits all’ – no que às formas de trabalhar diz respeito – chegou, definitivamente, ao fim.