Distribuição de lucros em sociedade no regime simplificado ou de transparência fiscal
As sociedades comerciais, por quotas ou anónimas, podem ser sujeitas a vários regimes de tributação, em sede de IRC, independentemente do regime de contabilidade que estejam a aplicar. O regime regra é o da tributação com base na contabilidade, mas também podem optar pelo regime simplificado de tributação[1], nas condições previstas, ou serem tributadas pelo regime da transparência fiscal[2], nos termos previstos no Código do IRC.
O regime simplificado de tributação consiste na determinação da matéria coletável relevante através da aplicação dos coeficientes especificados no código[3]. Neste caso, não há correções ao resultado contabilístico, porque este não é relevante para o efeito. Após o apuramento do imposto, este é registado na contabilidade e apurado o respetivo resultado líquido que, após aprovação na assembleia geral, se destina, entre outras possíveis aplicações, à distribuição pelos sócios, nos termos gerais.
No caso da tributação pelo regime da transparência fiscal, a sociedade não apura matéria coletável em sede de IRC, uma vez que a tributação do resultado apurado é realizada pela afetação desse resultado, apurado na sociedade, à esfera pessoal dos sócios, em sede de IRC – caso os sócios sejam pessoas coletivas, ou em sede de IRS – caso os sócios sejam pessoas singulares, e não prejudica os procedimentos contabilísticos e societários aplicáveis à distribuição de lucros nas sociedades comerciais.
Isto é, o sócio integra o resultado no seu rendimento, sujeitando-o a imposto – no caso de resultado positivo -, independentemente de este ter sido distribuído ou não, e aquando da distribuição do resultado da sociedade, ao sócio, já não haverá lugar ao pagamento de imposto, evitando uma dupla tributação[4].
Assim, a gerência da sociedade deverá elaborar e submeter à Assembleia Geral, para deliberação, o resultado líquido apurado, nos termos previstos na legislação contabilística e comercial aplicável.
Para a deliberação sobre a aplicação dos resultados, é importante ter-se em consideração:
- Caso o resultado seja negativo, é tratado como prejuízo, nos termos gerais das sociedades, e caso tornem o capital próprio inferior a metade do capital social devem ser consideradas as seguintes condições prevista para deliberação dos sócios[5]:
- A dissolução da sociedade;
- A redução do capital social para montante não inferior ao capital próprio da sociedade, com respeito, se for o caso, do disposto no n.º 1 do artigo 96.º (tutela dos credores);
- A realização pelos sócios de entradas para reforço da cobertura do capital.
- Para o caso de o resultado apurado ser positivo (lucro), há que considerar as seguintes obrigações:
- A constituição ou reforço da reserva legal[6], pela quantia correspondente a 1/20 do resultado[7] até que a reserva legal corresponda a 1/5 do capital social, com um limite mínimo de € 2.500. A utilização da reserva legal está condicionada[8] à cobertura da parte do prejuízo acusado no balanço do exercício que não possa ser coberto pela utilização de outras reservas, para cobrir a parte dos prejuízos transitados do exercício anterior que não possa ser coberto pelo lucro do exercício nem pela utilização de outras reservas ou para incorporação no capital;
- Ainda no caso de resultado positivo, há ainda a verificar outras limitações como a necessidade de cobertura de prejuízos[9], a cobertura de despesas de I&D (exceto se o montante das reservas livres e dos resultados transitados for, pelo menos, igual ao dessas despesas não amortizadas), rendimentos reconhecidos pelo uso do justo valor ainda não realizados[10] ou por resultados apropriados pelo método da equivalência patrimonial ainda não atribuídos;
- Verificada a disponibilidade dos resultados para distribuição aos sócios, a título de dividendos, a sociedade deverá então colocá-los à disposição dos sócios, e proceder ao respetivo pagamento.
Os registos contabilísticos propostos, para cada uma das fases do processo, serão os seguintes:
- Após o apuramento do resultado do período, há que transferir os saldos para o ano seguinte e, como primeiro lançamento contabilístico, transferir o resultado líquido apurado para resultados transitados.
D 81.8 – Resultado líquido
C 56 – Resultados transitados
- Com a deliberação da assembleia da sociedade sobre a aplicação dos resultados, incluindo a atribuição de dividendos aos sócios, deverá registar o crédito a favor destes.
D 56 – Resultados transitados
C 26.4 – Resultados atribuídos
C 5.X – Outras formas de retenção em capital próprio (Exemplo: reservas livres)
- Com a comunicação aos sócios de que poderão proceder ao levantamento dos lucros.
D 26.4 – Resultados atribuídos
C 26.5 – Lucros disponíveis
- Com o pagamento dos lucros, sem retenção de IRS/IRC, por terem sido imputados aos sócios ao abrigo do regime da transparência fiscal[11].
D 26.5 – Lucros disponíveis
C 12 – Depósitos à ordem
[1] Artigo 86.º A do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (CIRC)
[2] Artigo 6.º do CIRC
[3] Artigo 86.º B do CIRC
[4] Artigo 12.º do CIRC
[5] Artigo 35.º do CSC
[6] Artigo 218.º do Código das Sociedades Comerciais (CSC)
[7] Artigo 295.º do CSC
[8] Artigo 296.º do CSC
[9] Artigo 33.º do CSC
[10] Artigo 32.º do CSC
[11] Artigo 12.º do CIRC